SANTOS 1×0 MILAN – Dia 16 de Novembro de 1963

               Há mais de meio século, o Santos conquistou o bicampeonato mundial de clubes, quando este ainda era disputado com um jogo na Europa e outro na América do Sul. A equipe do Santos era a favorita para conquistar o titulo mundial de 1963. Além de contar com grandes craques e com o Rei Pelé, o time havia vencido o campeonato anterior em Lisboa, contra o Benfica. No entanto, não se pode prever o resultado de uma final Santos x Milan.

LIBERTADORES DA AMÉRICA

               Mas para chegar até esta final, o time de Vila Belmiro precisou conquistar a Taça Libertadores da América. O Santos como campeão do ano anterior, entra apenas na semifinal da competição sul-americana. E o adversário é o seu grande rival no futebol brasileiro, o Botafogo do Rio de Janeiro. Nunca houve e nunca haverá um clássico interestadual do nível de Santos x Botafogo.       Quando eles se encontravam, o que estava em campo era, sem exagero, a própria seleção brasileira.  E o Botafogo de Garrincha, Didi, Zagallo, Nilton Santos, Amarildo, Quarentinha e Manga era o adversário santista na semifinal da Libertadores. No Pacaembu, o jogo fica no 1×1. No segundo, no Maracanã, o palco ideal para mais um show do Santos: 4×0, com três gols de Pelé e um de Lima.

A decisão, desta vez, é contra o futebol argentino, que ainda não iniciou sua supremacia de títulos na competição sul-americana e, pelos pés do Boca Juniors, busca a sua primeira conquista.  No Maracanã, o Santos chega a abrir 3×0, com dois gols de Coutinho e um de Lima, mas o baixinho Sanfilippo faz dois e o Boca consegue uma derrota honrosa por 3×2, que dá mais emoção ainda ao segundo jogo, na Bombonera, uma semana depois.

               E Sanfilippo, no dia 11 de setembro de 1963, põe o Boca em vantagem. Mas Coutinho e Pelé viram para o Santos, que conquista o bicampeonato continental com Gilmar; Dalmo, Mauro, Calvet e Geraldino; Zito e Lima; Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe. O Boca Juniors jogou com; Herrera, Simenone, Madalena, Orlando e Silveira;  Rattin, Rojas, Grillo, Menendes e Gonzáles. O juiz da partida foi o francês Marcel Dublóis.  E com esta vitória de 2×1 contra o Boca Junior em pleno estádio La Bombonera, o Santos F. C. conquistaria o Bi-Campeonato da Libertadores da América, e partiria para o Bi Mundial, que desta feita seria contra a equipe italiana, a poderosa Milan.

MUNDIAL DE CLUBES

               Este foi o mais catimbado dos grandes títulos do Santos, sem dúvida. Cheio de reviravoltas, provocações, dramaticidade e, por fim, a alegria santista. No primeiro jogo, em Milão, o Milan faz 4×2. Pelé marcou os dois gols para a equipe brasileira, enquanto que Amarildo (2), Trapattoni e Mora marcaram para os italianos. Esta partida foi realizada dia 16 de outubro de 1963, no estádio San Siro na cidade de Milão – Itália. O Santos jogou esta partida com a seguinte equipe;  Gilmar, Lima, Haroldo, Calvet e Geraldino; Zito e Mengalvio;  Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe.   E o Milan jogou com;  Ghezzi, David, Maldini, Trebbi, Trapattoni e Delagalli;  Mazzola e Mora;  Norguitti, Rivera e Amarildo. O árbitro da partida foi Alfred Haberaller, da Áustria, que teve uma excelente atuação. Os brasileiros Altafini, o Mazola, e Amarildo destacam-se no time italiano. Pelé, que marcou os dois gols santistas na primeira partida, está fora do restante da decisão. Seu substituto, Almir, promete acertar Amarildo e dar o título aos santistas no segundo jogo.

               A derrota em Milão não preocupou a equipe santista, o que preocupava realmente, para o segundo confronto, era a ausência de Pelé, Zito e Calvet. Mas, mesmo assim, a equipe era muito experiente e acreditava na vitória.  Na verdade não havia desfalque, pois quem entrava na equipe dava conta do recado. Além disso, os três que não jogaram, viajaram para o Rio de Janeiro, deram o incentivo, confiaram no time e isto foi muito importante para todo o grupo.

               Chegava o dia da segunda partida, 14 de novembro de 1963, e esta seria realizada aqui no Brasil, no estádio do Maracanã, pois o estádio da Vila Belmiro não se enquadrava na exigência da FIFA.  O Santos não querendo jogar no Pacaembu, pois achava que corintianos, palmeirenses e são-paulinos poderiam torcer contra, resolveram levar esta partida para o Rio de Janeiro. O Santos jogou com; Gilmar, Ismael, Mauro, Haroldo e Dalmo;  Lima e Mengálvio; Dorval, Coutinho, Almir e Pepe.  Enquanto que a equipe italiana jogou com; Ghezzi, David, Maldini, Trapattoni, Trebbi e Delagalli, Mazzola e Mora, Norguetti, Rivera e Amarildo.  O árbitro da partida foi Juan Brozzi da Argentina.

               Mazzola e Mora fazem 2×0 para o Milan, e é um Almir cheio de raça e disposição que contagia a virada sensacional do Santos. Pepe (2), Almir e Lima marcam para o time brasileiro e provocam, com os 4×2, o mesmo placar da primeira partida, uma partida-extra, dois dias depois, no mesmo Maracanã.              

               Dia 16 de novembro de 1963, novamente Santos e Milan entram em campo no Maracanã, e desta vez será para definir quem realmente será o grande campeão mundial interclubes. O árbitro da partida foi novamente o argentino Juan Brozzi.  O Milan jogou esta partida com; Balzarini, Belagalli, Maldini, Trebbi, Trapattoni e Benitez, Lodetti e Mora, Mazzola, Amarildo e Fortunato. O Santos jogou e venceu com; Gilmar, Ismael, Mauro, Haroldo e Dalmo, Lima e Mengálvio, Dorval, Coutinho, Almir e Pepe.

               O jogo começou com muito estudo, até que aos 31 minutos do primeiro tempo, o árbitro marcou um pênalti a favor do Santos. Pelé que era o cobrador oficial não estava em campo. Pepe era quem costumava bater os pênaltis, mas, segundo ele, por amizade e confiança em Dalmo, deixou que o lateral esquerdo cobrasse. E Dalmo cobrou do lado esquerdo do goleiro Balzarini, que acertou o canto, mas não conseguiu pegar. Santos 1 a 0 e este foi o placar final da partida. Dalmo jogou no Santos de 1957 até 1964 e nesse período marcou somente quatro gols com a camisa do Peixe, mas este do dia 16 de novembro de 1963, valeu por muitos. O lateral recorda que não conteve as lágrimas ao dar a volta olímpica no Estádio do Maracanã comemorando a valorosa conquista, e que até hoje se emociona ao lembrar daquela noite memorável e inesquecível. O time se tornou guerreiro. Os que substituíram os titulares, substituíram acima da altura. Foi uma superação muito grande de garra, raça e união”.

               Com o estádio lotado, Dalmo recorda cada segundo que antecedeu ao chute histórico. “Era um barulho ensurdecedor, 130 mil pessoas gritando. Houve um desentendimento. Quando eu ia bater, dava a paradinha, (sou o inventor da paradinha), e o goleiro se adiantava. O árbitro mandou que eu não fizesse a paradinha e que o goleiro não se adiantasse. Fui frio e calculista, pois estava acostumado a cobrar pênaltis nos outros clubes que joguei. Quando corri para a bola, o estádio silenciou. Mas já estava decidido. Fiz o gol”.

               A conquista do título foi comemorada de maneira simples. Afinal, o grande Santos estava acostumado a conquistas. No dia seguinte os jogadores saíram para passear pelo centro do Rio de Janeiro sem serem incomodados pelos torcedores. Coutinho por exemplo, juntamente com Dorval, Ismael e Almir e mais dois ou três jogadores, foram assistir a um espetáculo do humorista Costinha. Ao chegarem em Santos, desfilaram no carro de bombeiros. O grupo estava acostumado a ganhar títulos e aquele, apensar de muito importante e de grande expressão, era apenas mais um para a coleção de uma equipe vencedora como aquela que o Santos teve no início da década de 60, uma equipe que certamente jamais terá em toda sua história. Quem viu, viu, quem não viu, jamais verá.

ALMIR O PERNAMBUQUINHO

               Poucos torcedores do Santos lembram com detalhe a passagem de Almir pela Vila Belmiro. Na lembrança apenas aqueles jogos contra o Milan na decisão do mundial de 1963, quando recebeu a incumbência de substituir Pelé.  Nunca foi titular absoluto na equipe santista. Sua imagem ficou arranhada quando depois de dez anos da conquista do título, deu uma declaração que havia jogado dopado naquela decisão contra o Milan. Todos podiam ouvir os gritos que ele dava nos vestiários antes de entrar em campo “eu não posso perder, o Santos não pode perder”. Essa vontade ferrenha tinha sua razão de ser. Almir jogou no futebol italiano, colecionou mágoas e decepções, e justamente naquela noite enfrentava pela primeira vez seu ex-Milan.

              Tudo começou quando Almir jogava no Milan e também o brasileiro Amarildo, aquele que substituiu Pelé na Copa de 62 e saiu-se muito bem. Segundo Almir, certa vez viu o Amarildo humilhar outro jogador brasileiro, Germano, ponta que jogou no Palmeiras e casou-se com um princesa lá na Itália. Revoltado com aquilo e considerando Amarildo um racista, prometeu dar o troco na primeira oportunidade que se encontrassem. E ela surgiu justamente naquela noite da grande decisão. O goleiro do Milan começou a jogada com o meia campista Mora pelo setor direito da defesa. Quando a bola foi passada para o Amarildo, o Almir chegou chutando tudo, a bola e a bola do tornozelo de Amarildo. Depois saiu de perto satisfeito, como se vingança estivesse consumada. No final do jogo, Almir era o que mais comemorava a vitória, como tivesse saído um peso de seus ombros.

               Tudo isto aconteceu há mais de 50 anos. Parece que foi ontem. Os televisores do Brasil inteiro estavam ligados na TV Tupi ouvindo a transmissão de Walter Abraão, comentários de Geraldo Bretas e as reportagens de campo de Eli Coimbra, um trio que marcou história no esporte na televisão brasileira e que hoje moram lá no céu. Bons tempos aqueles, quando o futebol era realmente uma paixão nacional, sem violência, sem torcidas organizadas, onde só predominava a beleza e a arte do futebol brasileiro. Quem teve esta felicidade, agradeça a Deus, pois é um sujeito privilegiado.  

SANTOS FUTEBOL CLUBE – 1963      –     Em pé: Haroldo, Dalmo, Lima, Ismael, Gilmar e Mauro      –     Agachados: Dorval, Mengalvio, Coutinho, Almir e Pepe
MILAN – 1963      –     Em pé: Belagalli, Trebbi, Dino Sani, Maldini, Benitez e Lodetti      –     Agachados: Trapattoni, Mora, Balzarini, Mazzola e Fortunato

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