BRASIL 4×1 ITÁLIA – Dia 21 de Junho de 1970

               Com a decadência de Garrincha e a idade avançada de alguns craques bicampeões do mundo, o Brasil sepultou definitivamente as lembranças da Copa de 1966. Para o mundial de 1970, teríamos que recomeçar tudo outra vez. E a CBD começou procurando um novo treinador. Antonio Passos, presidente da comissão técnica, fez um convite formal ao jornalista João Saldanha. Ele aceitou na hora. O “sim” de Saldanha provocou as mais diversas reações dos muitos pretendentes ao cargo de treinador da seleção.

               Terminava a expectativa e começavam as críticas que somente foram contidas na medida que João Saldanha, com seu jeitão e sua coragem, conquistou o torcedor brasileiro. Os descontentes, diziam que o novo técnico estava afastado do futebol e, no mínimo desatualizado para enfrentar os problemas que a seleção iria ter pela frente. Como sempre, havia o bairrismo, agravado, agora, pelo clubismo.

               No dia 5 de fevereiro de 1969, começava um longo período de treinamento visando a Copa do México. Mas, primeiramente, o Brasil teria que passar pelas eliminatórias. Venezuela, Paraguai e Colômbia estavam no caminho do Brasil. E no dia em que falou pela primeira vez sobre a sua seleção, Saldanha escalou seu time; Feliz, Carlos Alberto, Brito, Djalma Dias e Rildo; Wilson Piazza, Gerson e Dirceu Lopes; Jairzinho, Pelé e Tostão. O time reserva também foi escalado; Cláudio, Zé Maria, Scala, Joel Camargo e Everaldo; Clodoaldo, Rivelino e Paulo Cesar Cajú; Paulo Borges, Toninho Guerreiro e Edu.

               O goleiro Cláudio foi dispensado por motivos médicos e foi substituído pelo alagoano Lula Monstrinho que jogava no Corinthians. E o técnico afirmava que queria em seu plantel verdadeiras feras. E foi ai que surgiu “as feras do Saldanha”. Estava estabelecida a confiança entre técnico e torcedor. E ela iria crescer com as vitórias da seleção nas eliminatórias. Seis jogos, seis vitórias. Marcamos 23 gols e tomamos apenas 2. A grande fera da seleção de Saldanha foi Tostão. Estava numa forma excepcional. Na fase eliminatória do mundo inteiro, ninguém fez mais gols que Tostão.

              Mas logo se manifestaram os choques que levaram João Saldanha, gradativamente, a uma situação de total isolamento. Para isso concorreram vários fatores. Problemas técnicos, ressentimentos pessoais e também o nervosismo e a instabilidade de um homem que assumiu a sobrecarga de todo o esforço de recuperação do futebol brasileiro.

              Saldanha ainda duraria mais quatro dias. Resistindo por teimosia, ele se sentia cada vez mais enfraquecido e isolado. Sua valentia se transformaria em inconveniência. Quando alguém muito bem relacionado ao governo federal lhe falou de quanto o presidente Emilio Garrastazu Médici apreciava o futebol de Dario, Saldanha respondeu que para seu lugar tinha dois jogadores. E completou: “Quem escala a seleção sou eu. O presidente escala seu ministério”.

              O treinador começou a esbarrar em interesses de toda ordem. Para completar, escalou a seleção sem Pelé para um amistoso contra o Chile. Alegou que Pelé estava míope. Essa atitude provocou uma tempestade que foi enfrentada por um homem cansado, nervoso, as vezes, descontrolado. Criticado por Yustrick, Sadanha invadiu a concentração do clube da Gávea, de revolver em punho, para tomar satisfação com o técnico do Flamengo. O presidente do clube prestou queixa crime contra o invasor de domicílio. No dia seguinte, João Havelange, presidente da CBD, dissolveu a comissão técnica da seleção. Ao saber da notícia, Saldanha teria dito: “Não sou sorvete para ser dissolvido. Se isso quer dizer demitido, vou para casa dormir”.

               Saldanha, nos últimos dias de seleção, já não era um exemplo de coerência. Na noite da demissão, confidenciou a alguns jornalistas que Pelé sofria de miopia em alto grau. No dia seguinte, em programa de televisão, desmentia essas declarações, afirmando que o mal de Pelé era outro, muito mais sério. Com a comissão técnica dissolvida e o afastamento do treinador João Saldanha, a seleção teria que começar tudo de novo.

               No dia 18 de março se verificou que, da comissão técnica da seleção, somente João Saldanha e Adolfo Milman haviam sido afastados. As demissões citadas anteriormente, foram apenas um pretexto para tirar Saldanha do comando da seleção. Enquanto se procurava outro técnico, Chirol dirigiu os treinos. Afinal, dali por diante, não precisariam mais do João Sem Medo. O caminho para a Copa estava aberto. Naquele momento tudo era questão de organização e paciência, de talento futebolístico e muita habilidade dentro e fora do campo.

               A nova fase da seleção começou com Havelange convidando Dino Sani para dirigir a seleção. Dino impõe condições que não são aceitas pela CBD. Oto Glória também recebe convite e recusa. Entretanto, na Praia Vermelha, Zagallo recebe convite de Antonio Passos e aceita rapidamente. Ele assumiu no mesmo dia e começou com altos e baixos. Na parte tática, procurava preservar sua tradicional teimosia, na inclinação por um futebol pouco ofensivo.

              Ao mesmo tempo, dava provas de flexibilidade ao fazer novas convocações. Além de Leônidas, Arilson e Roberto Miranda, veio o craque do presidente Médici, Dario. Os dois primeiros terminaram sendo cortados. Durante os treinamentos Zagallo escalou o ataque com Jairzinho, Roberto, Pelé e Paulo Cesar Caju. A imprensa perguntava – “E Tostão ?”.  O treinador declarava que ele era apenas o reserva de Pelé. No seu time não havia lugar para dois gênios da bola.

               No jogo contra a Bulgária, Zagallo começou com Tostão que depois foi substituído por Pelé. A seleção não se encontrou e o resultado foi de 0x0 com Paulo Cesar Caju levando a maior vaia da história do Morumbi. Paulo Cesar estava pagando pelo irredutível apego do técnico ao sistema de 4-3-3. Praticamente não havia jogadas de ataque. O torcedor brasileiro começou a sentir que com aquela formação, o Brasil não iria muito longe na Copa.

              Ainda haveria um jogo no Maracanã contra a Áustria. Era a última chance de reestruturar a seleção. No dia 28 de abril, no Palácio Guanabara, aconteceu a recepção de despedida da seleção que embarcaria para o México no dia primeiro de maio. Lá estava a imprensa e personagens do mundo político e desportista. Quando Zagallo saiu da solenidade já tinha um novo ataque para a seleção enfrentar a Áustria: Jairzinho, Pelé, Tostão e Rivelino.

               Na véspera da partida de despedida, no quarto de Pelé, se reuniram com ele, Gerson, Clodoaldo, Tostão e Rivelino. Conversaram mais de uma hora. Depois, papearam com Zagallo. Gerson seria o comandante dentro de campo. Ele gritou, orientou, comandou e instruiu. Foi um verdadeiro técnico dentro das quatro linhas. Daí para frente o improviso substituiu a rigidez dos esquemas. O time brasileiro não voltou a inflexível formação do 4-3-3. Do ponto de vista tático, se dava um grande passo para a vitória.

COPA DE 1970

               O Brasil fez sua estreia no dia 3 de junho contra a Checoslováquia e venceu com certa facilidade por 4 a 1. Depois teve um jogo bem mais difícil contra a Inglaterra, mas também venceu por 1 a 0 e fechando sua participação nesta primeira fase, derrotou a Romênia por 3 a 2. Com isto estava classificado para as quartas-de-final e o adversário seria o Peru, que tinha como treinador o brasileiro Didi, que foi bicampeão mundial com nossa seleção em 1958 e 1962.

              O jogo aconteceu no estádio Guadalajara no dia 14 de junho. Foi um jogo disputado com lealdade e muita técnica. Cinquenta e quatro mil pessoas viram o Brasil vencer por 4 a 2. Na semi-final o Brasil enfrentou o Uruguai, que ainda estava atravessado na garganta desde 1950, quando nos tiraram o titulo em pleno Maracanã. Seria então o jogo da vingança. O jogo foi no estádio de Guadalajara no dia 17 de junho. O Uruguai abriu o placar aos 18 minutos da primeira etapa, mas Clodoaldo empatou aos 45 minutos.

             No segundo tempo, o Brasil voltou bem melhor e aos 31 minutos Jairzinho marcou o segundo gol brasileiro e já no finalzinho da partida, Rivelino acertou um chute de fora da área e fechou o placar. Brasil 3×1 Uruguai. Com esta vitória o Brasil estava em mais uma final de Copa do Mundo e seu adversário seria a fortíssima Itália, que na outra semi-final derrotou a Alemanha por 4 a 3, num dos jogos mais emocionantes do mundial. Na decisão do terceiro lugar, a Alemanha venceu o Uruguai por 1 a 0.

O JOGO DO TÍTULO

               Chegava ao final a Copa de 1970, era o dia 21 de junho, o povo mexicano sorria e comemorava o grande sucesso daquele importante evento. No estádio Azteca, com 107.000 pagantes, a Taça Jules Rimet teria, obrigatoriamente, um possuidor definitivo, porque da final entre Brasil e Itália sairia um tricampeão.

               O alemão oriental Rufolf Glockner foi o árbitro da partida. Neste dia o técnico Zagallo mandou a campo a seguinte formação; Felix, Carlos Alberto, Brito, Piazza e Everaldo; Clodoaldo, Gerson e Rivelino; Jairzinho, Tostão e Pelé. Enquanto que a Itália jogou com; Albertosi, Burgnich, Cera, Rosato e Faccheti; Domenghini, De Sisti e Bertini (Juliano); Mazzola, Boninsegna (Rivera) e Riva.

               O jogo começou com muito estudo de ambos os lados, mas Pelé de cabeça aos 17 minutos fez 1 a 0 para o Brasil. A Itália empatou aos 37 minutos, com um gol de Boninsegna. Na fase final, o Brasil dominou as ações desde o primeiro minuto, mas somente aos 25 minutos num chute forte de Gerson de fora da área fez 2 a 1. Seis minutos depois, Pelé na área desviou levemente a bola para Jairzinho, que aumentou o placar. Os brasileiros dominavam inteiramente a Itália. A três minutos do final, Pelé atraiu três defensores italianos e rolou a bola suavemente para a direita. Carlos Alberto, vindo de trás, sem parar, disparou um chute cruzado e marcou o quarto gol brasileiro. Brasil 4×1 Itália.

               Brasil tricampeão mundial. Os mexicanos vibravam com os brasileiros, aplaudindo nossa seleção. Carlos Alberto nosso capitão subiu a rampa que levava à tribuna de honra do estádio, onde recebeu do presidente do México, em caráter definitivo, a Copa Jules Rimet.

SELEÇÃO BRASILEIRA DE 1970  –  Em pé: Carlos Alberto, Brito, Piazza, Félix, Clodoaldo e Everaldo     –      Agachados: Jairzinho, Rivelino, Tostão, Pelé e Paulo César
SELEÇÃO DA ITÁLIA – 1970    –    Em pé: Albertosi, Faccheti, Burgnich, Cera, Rosato e Bertini     –    Agachados: Domenghini, Giancarlo, Mazzola, Boninsegna e Riva

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