DOPING NA DECISÃO DO CARIOCA DE 1948

                  Na revista O Cruzeiro de 19 de novembro de 1966, João Saldanha relata o caso, segundo ele, “pitoresco” (do ponto de vista alvinegro, é claro), acontecido no Campeonato Carioca de 1948, quando o Botafogo foi campeão. Essa história ficou comprovada. Foi uma história de “doping” negativo.

                  Quando começou o campeonato, a torcida do Botafogo ficou preocupada e achava que o título não viria naquele ano, tudo por conta a estreia catastrófica que fez ao ser goleado pelo São Cristóvão por 4 a 0. No entanto, com o decorrer dos jogos o time foi se entrosando e quando chegou nas últimas rodadas o torcedor passou a ficar mais empolgado e confiando no título.

                  O Botafogo precisava alijar o Vasco do campeonato, mas antes jogava com o Flamengo. Arquitetaram um plano, em General Severiano, com o rubro-negro como “cobaia”. A turma botafoguense sabia que os flamenguistas tomavam chá, no intervalo do jogo. E foi nele que agiu.

                  No dia da partida, bem na porta do vestiário do Flamengo, havia um guarda. Cada jogador que entrava recebia um cumprimento amigável, de autêntico rubro-negro: “- Bola pra frente, moçada”. Na verdade era um fanático alvinegro, ali com uma finalidade: vigiar a entrada.

                  Pouco depois que o jogo começou, através de uma porta falsa (estavam no campo do Botafogo), que dava para o vestiário dos escoteiros, entrou o dopador. Pegou a enorme garrafa térmica, que continha o chá do time do Flamengo, passou a pura bebida para outra vasilha, e substituiu-a por outra, com o barbitúrico. E caiu fora.

                  A rubro-negrada voltou, cheia de sede, e engoliu o chá. Vinham eufóricos, pois o Flamengo vencia por 3 a 1 o primeiro tempo. Voltaram a campo meio sonolentos e entraram bem: Botafogo 5 a 3. Enquanto isso, o mesmo sujeito, encarregado do “doping” (neste caso negativo, é lógico), penetrava novamente no vestiário, levava a garrafa e devolvia a ela em igual quantidade o imaculado chá retirado antes.

                 Se fizessem algum exame, nada encontrariam naquela bebida. E tudo com a vigilância eficaz do guarda “rubro-negro”. Depois a turma da Gávea ficou um pouco desconfiada, mas, como o time estava fora do páreo, não deu bola para o caso.

                No domingo seguinte, dia 12 de dezembro de 1948, o Botafogo jogava com o Vasco no estádio de General Severiano, que pertence ao Botafogo. Às 11 horas o estádio já estava lotado. Para esta partida o técnico botafoguense Zezé Moreira, mandou a campo os seguintes jogadores; Osvaldo Baliza, Gérson e Nílton Santos; Rubinho, Ávila e Juvenal; Paraguaio, Geninho, Pirillo, Octávio e Braguinha. Já o técnico vascaíno Flávio Costa escalou a seguinte equipe; Barbosa, Augusto e Wilson; Ely, Danilo e Jorge; Friaça, Ademir Menezes, Dimas, Ipojucan e Chico. O árbitro foi Mário Vianna.  

                E a coisa foi repetida, baseada no sucesso da experiência anterior contra o Flamengo. Só que, dessa vez, o Vasco levou café, e foi essa a bebida substituída. E o guarda, como é natural, agora era “vascaíno” doente.

                Aconteceu até um fato curioso: um diretor do Vasco, de nome Armando, muito amigo, na época, do Ademir de Menezes, tomou um pouco do café com barbitúrico. Passou o segundo tempo dormindo, na arquibancada, enquanto o jogo se desenrolava lá embaixo. O Botafogo ganhou por 3 a 1. Na verdade, no primeiro tempo, já vencia por 2 a 0, gols de Paraguaio e Braguinha. Na etapa complementar o Fogão ampliou o marcador através de Otávio, enquanto que o Vasco marcou seu gol de honra num gol contra do zagueiro Ávila.

               O dopador botafoguense, porém, não foi muito na conversa do marcador, e preferiu garantir o resultado final. A turma do Vasco desconfiou e mandou examinar a cafeteira. Como é natural, nada encontrou que provasse o “doping”. Chegaram até a prender o cozinheiro cruzmaltino, certos de que ele colocara algo na comida. Mais tarde souberam o que acontecera, mas aí não adiantava mais estrilar.

               E as coisas não param por aí. Segundo relado do goleiro vascaíno, Barbosa, houve também a questão do pó-de-mico. “O vestiário ficava embaixo da arquibancada e por ali sopraram pó-de-mico. Com o verão que estava e a gente suando, o pó-de-mico pegou. Eu fiquei com as mãos em carne viva. Isso aconteceu no intervalo”.

Deixe uma resposta