JOÃO SALDANHA: a conquista do Tri começou com ele

                    João Alves Jobin Saldanha nasceu dia 3 de julho de 1917, na cidade de Alegrete – RS. Foi um jornalista e treinador de futebol. Aos 14 anos de idade, sua família mudou-se para o Rio de Janeiro, onde jogou por alguns anos no Botafogo. Formou-se em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, atual UFRJ. Estudou jornalismo e se tornou um dos mais destacados escritores de esportes, antes de se tornar comentarista no rádio e na televisão.

                  Como jornalista esportivo, ele frequentemente criticava jogadores, técnicos e times de futebol, e foi um membro do Partido Comunista Brasileiro. Sempre foi um homem polêmico, até com Presidente da República ele chegou a ter atritos e com isto acabou deixando o comando técnico da nossa seleção canarinho. Em 1957 o Botafogo, seu clube do coração, o contratou como seu técnico, apesar de sua total falta de experiência. Naquele ano foi campeão estadual.

SELEÇÃO  BRASILEIRA

Em 1969, foi convidado pela CBD – Confederação Brasileira de Desportos, para ser o técnico da Seleção Brasileira. Ele aceitou o convite e começou a trabalhar. Imediatamente começou a preparar a lista de jogadores que iriam disputar as eliminatórias para a Copa de 70, no México.  Convocou um time formado em sua maioria por jogadores do Santos e do Botafogo, os melhores clubes da época; e os conduziu a 100% de aproveitamento em seis jogos de qualificação (Eliminatórias). De uma frase sua, que teria dito que convocaria somente “feras”, surgiu a expressão As feras do Saldanha para designar aquela seleção. Graças ao seu trabalho, a seleção brasileira reconquistaria a auto-estima e a confiança do torcedor, que tinha perdido depois da pífia campanha na Copa do Mundo de 1966.

                O time de Saldanha, que deu show nas Eliminatórias contra Venezuela e Paraguai, com a dupla Tostão e Pelé, estava mesclada com jogadores do Santos, Botafogo e Cruzeiro, os três grandes da época. Foi uma grande jogada de Saldanha. Usou o entrosamento dos jogadores em seus respectivos times e atuava num 4-2-4 bem montado. O time brasileiro de Saldanha era: Cláudio, Carlos Alberto, Djalma Dias, Joel e Rildo; Piazza e Gerson; Jairzinho, Tostão, Pelé e Edu.

               Embora muito se dizia à época, que Saldanha foi retirado do comando da seleção por causa da sua negativa em selecionar jogadores que eram indicados pessoalmente pelo presidente, Emilio Garrastazu Médici, em particular o atacante Dario Maravilha, foi constatado posteriormente que tal fato em verdade não ocorreu, limitando-se o então presidente, na qualidade de torcedor, a sugerir a convocação de Dadá, tal como na Copa de 2010 se sugeriu a Dunga a convocação de Neymar ou Paulo Henrique Ganso, ambos do Santos. O último atrito foi quando o auxiliar-técnico pediu para sair da seleção, dizendo que era impossível trabalhar com Saldanha. Segundo João Havelange, então presidente da CBD, o esquema adotado por João Saldanha de dois pontas abertos (Jair e Edu) e o meio-campo desprotegido do Brasil, que adotava o esquema 4-2-4, não iria a lugar nenhum. Daí a demissão de João Saldanha e depois de uma tentativa de se contratar Dino Sani, ele foi substituído por Zagallo, ex-jogador de futebol e ganhador de duas copas: Copa do Mundo de 1958 e 1962, com seu tradicional e eficiente (na época) 4-3-3, montando a equipe com Félix, Carlos Alberto, Brito, Piazza e Marco Antônio (depois Everaldo); Clodoaldo, Gérson e Rivelino; Jair, Tostão e Pelé.

RELATO  DE  JOÃO  SALDANHA

               “Um dia o doutor Antônio do Passo apareceu na minha casa e me convidou para ser o treinador da Seleção Brasileira. Não falou em contrato, em dinheiro, em nada. Só perguntou se eu queria ser o treinador da Seleção. Eu disse a ele: Isso é uma sondagem ou um convite? É um convite. Topo.  Eu disse à imprensa que já tinha sido convidado três vezes. Mentira: fui convidado cinco vezes, em 1958, 1966, 1967, 1968 e 1969. Aceitei porque achava que daria uma dimensão maior à luta que sempre travei na imprensa. Topei sabendo que iria brigar contra a inveja, a calúnia, a perfídia. Sabia que ia me aborrecer muito. Que ia lutar contra tudo.

Fomos para as Eliminatórias. Ganhamos. Tive problemas sérios. Nenhum dentro do campo. Problemas de campo eram difíceis: nosso time era bom, e os nossos adversários não eram muitos bons. Fomos para a Colômbia em cima da hora. Não dava para formar um time. Preferi a base do Santos. Fui criticado, massacrado. Todos diziam que o Santos estava podre. Mas foi o Santos e mais três jogadores que vencemos a Inglaterra, campeã do mundo. Com o Santos e mais três ou quatro, classificamos o Brasil para as finais da Copa.  Houve inveja, ciúmes, calúnia. Todos os dias, dirigentes diziam; “Ponha a imprensa daqui pra fora”. Eu dizia não. O diálogo com a imprensa é importante porque, mesmo que mintam, que deturpem, nós estaremos colocando nosso país mais em cima, mais alto. Num programa de televisão em Hamburgo, Alemanha Ocidental, o entrevistador perguntou: O que o senhor acha da matança de índios no Brasil? Eu respondi:  Nosso país tem 470 anos de história. Nesses 470 anos foram mortos menos índios do que dez minutos de guerra provocada por vocês. Os selvagens são vocês. A televisão saiu do ar, o apresentador não falou mais comigo. 

               Quando entrei na Seleção, não me fizeram injunções. Todos os brasileiros têm o seu time, eu tinha o meu, como brasileiro. Escalei o meu time. Entre os 16 países classificados para a Copa, o Brasil foi o que conseguiu a classificação mais brilhante, mais elogiada pela imprensa estrangeira.  Eu sabia que a Seleção estava desmoralizada. O Maracanã não enchia nem contra a Seleção da Fifa, nem contra a Argentina. O povo não acreditava mais. Eu achava que devia promover o nosso futebol. Provocar, chamar a atenção pra cima da gente, pra cima de mim se fosse preciso. Fui por aí, enfrentando as paradas. Quiseram impor a convocação de Dario – por sinal, um bom jogador. Era de alto nível, mas não de tão alto nível como eram os jogadores de que a seleção precisava, como Pelé, um Tostão, um Dirceu Lopes, um Gérson, um Clodoaldo, um Rivelino, um Jairzinho. Embora Dario fosse um bom jogador do ranking brasileiro, não existia lugar para ele nessa turma.

                Mas, como Dario era do Atlético Mineiro e o governo naquele tempo precisava uma barretada pra Minas Gerais, quiseram botar Dario à força. Recusei. Puseram para fora Toninho – do Santos – um grande goleador com quase novecentos gols, por causa de uma sinusite. Antônio do Passo e João Havelange diziam: “Pelo amor de Deus, convoque Dario, nem que seja pra ele nem mudar de roupa. Convoque pelo nome, porque vamos ficar bem com os homens e precisamos de dinheiro!”. Não convoquei. João Havelange dizia: “Pelo amor de Deus, convoque Dario! Convoque pelo nome!” Então lhe disse; O presidente escala seu ministério, eu escalo o meu time.

               De repente surgiu uma crise. Se me perguntarem hoje porque fui demitido, palavra de honra, juro pela minha esposa e pelas crianças que não sei. Porque não me deram nenhuma explicação, tentaram fazer com que eu pedisse demissão. Disseram que a Comissão Técnica estava dissolvida. Eu respondi: Não sou sorvete para ser dissolvido.  Que quer dizer dissolvido? Demitido? Está demitido.  Até logo, boa noite, vou para casa dormir. E não há ninguém que tire a tranquilidade do meu sono. Por que aconteceu isso? Não sei bem. Vou tentar adivinhar”.

CONFUSÕES

             Na noite de 17 de dezembro de 1967, num programa esportivo, estavam vários especialistas no assunto, inclusive João Saldanha. O assunto só poderia ser um: a vitória do Botafogo por 2 a 1, à tarde, no Maracanã (gols de Roberto e Gérson), conquistando o título carioca (o Bangu tentava o bi). Lá pelas tantas, João Saldanha, com sua habitual franqueza, disse que o goleiro Manga tivera uma atuação suspeita. Minutos depois, Castor de Andrade, que morava ali perto, invadiu os estúdios da TV Globo portando um revólver de ouro maciço e ameaçando João Saldanha, que não se intimidou: jogou um pesado cinzeiro sobre Castor e, logo em seguida, um copo d´água. O clima ficou pesado. Pesadíssimo, por sinal. Formado o tumulto sem tiros, por sorte, o programa saiu do ar. Na quarta, dia 20, à noite, na sede do Mourisco Pasteur, houve um jantar de confraternização, Quando a festa já começara, João Saldanha, chegou acompanhado de Luiz Mendes e Bebeto de Freitas que é parente de Saldanha. Nesse exato instante, Manga levantou-se da mesa e caminhou decidido em direção a Saldanha. João, que sempre andava armado, sacou seu revólver e deu dois tiros em Manga, que só não acertaram o alvo porque Bebeto e Mendes seguraram seu braço de maneira mais do que providencial. Um terceiro tiro ainda foi disparado a esmo. Manga, dotado de um porte físico extraordinário, fugiu em disparada e pulou, de uma só vez, o muro que cercava o Mourisco e desapareceu na noite. Sandro Moreyra, sempre galhofeiro, garantiu que Manga, naquela noite, batera o recorde mundial do salto em altura, pois que os muros do Mourisco mediam cerca de três metros.

                 Saldanha morreu em Roma dia 12 de julho de 1990, onde foi cobrir naquele ano a Copa do Mundo para a Rede Manchete. Até hoje não se sabe a razão. Fontes mais seguras dizem que Saldanha morreu de um efizema pulmonar, devido ao vício tabagista.

JOÃO SALDANHA AO LADO DE GERALDO JOSÉ DE ALMEIDA COMO COMENTARISTA
JOÃO SALDANHA COMO TÉCNICO DA NOSSA SELEÇÃO
JOÃO SALDANHA RECEBENDO O TROFÉU IMPRENSA DAS MÃOS DE SILVIO SANTOS
JOÃO SALDANHA EM DIA DE TREINAMENTO DA NOSSA SELEÇÃO
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