CAETANO: um carrasco para o Corinthians

                      Caetano Izzo nasceu dia 11 de maio de 1897, na cidade de São Paulo. Caetano acabara de chegar ao Palestra, saído do Ruggerone, clube ligado à colônia italiana, laço sentimental que os imigrantes logo direcionariam quase exclusivamente ao Palestra. Sua estreia ocorrera menos de dois meses antes, em vitória de 3 a 2 sobre o Paulistano, onde fez um gol, o primeiro dos 45 que marcaria pelo clube.

                      Naquele ano de 1917, o Campeonato de Foot-Ball da Associação Paulista de Sports Athleticos estava mais imponente: tinha o atrativo de receber clubes da recém-extinta Liga Paulista de Foot-Ball. Entre eles, seu atual campeão: o Corinthians.

                       Não por acaso, causava curiosidade o iminente encontro entre aquelas duas equipes: uma de origem operária e com inspiração inglesa; outra fortemente vinculada aos italianos que conseguiam se estabelecer em São Paulo depois das primeiras levas de imigrantes – que chegaram ao Brasil amontoados em porões de navios para trabalhar em plantações de café. Mas nenhuma curiosidade era suficiente para antever que aquele jogo seria o pontapé inicial de uma rivalidade que se tornaria centenária.

                        Só em 1920 o Parque Antarctica passaria a pertencer ao Palestra. Em 1917, quando o clube da colônia italiana fez seu primeiro jogo lá, o campo ainda era do Germânia. A estreia foi em 21 de abril, contra o Internacional-SP. E foi pé-quente: goleada de 5 a 1. O primeiro gol do jogo – consequentemente, primeiro gol da história do Palmeiras no local – foi anotado por Caetano.

                        Também seria lá que ocorreria o primeiro clássico contra o Corinthians, “um dos jogos  mais esperados no atual campeonato”, como ilustrou o “Correio Paulistano. Na descrição dos jornais da época, foi uma partida equilibrada no primeiro tempo, com ataques de lado a lado – tornando, segundo “A Gazeta” relatou.

                        Mas emocionante mesmo foi o segundo tempo. Foi aí que apareceu Caetano. Aos 15 minutos, ele “recebe a bola e, numa bela arrancada, aproxima-se do gol contrario, e, ainda um pouco distante, desfere um fortíssimo chute de curva, indo a bola bater na rede”. Estava aberto, no relato do “Correio Paulistano”, um placar que seria ampliado na sequência com mais dois gols do artilheiro: “outro cinco minutos depois, em ótimo chute, e mais um perto do fim da partida, quando novamente o excelente extrema direita Caetano envia violentamente a bola ao gol de Achilles, marcando o terceiro e ultimo gol do jogo”.

                        Foram três chutes de perna direita naquela tarde de 6 de maio de 1917: três conclusões precisas, três gols do mesmo jogador, um jovem de 19 anos chamado Caetano Izzo. E nascia, na distração de um domingo de outono em São Paulo, uma das maiores rivalidades do planeta.

                        Apesar da vitória, o Palestra não foi campeão naquele ano. Tampouco o Corinthians. Eles ficaram, respectivamente, em segundo e terceiro lugar no campeonato conquistado pelo Paulistano. Caetano só seria campeão paulista três anos depois, em 1920. E muito aconteceria em sua vida até lá.

                        Ainda em 1917, ele fez mais um gol contra o Corinthians, em vitória por 3 a 1. E acabou chamado para defender a seleção brasileira no Sul-Americano do Uruguai. Foi titular nos três jogos do Brasil: as derrotas de 4 a 2 para a Argentina e 4 a 0 para os donos da casa e a vitória de 5 a 0 sobre o Chile, quando fez um gol.

                         O Corinthians voltaria a ser vítima de Caetano em 1918. Ele marcaria mais três gols: dois em vitória de 4 a 2, outro em empate por 3 a 3 (seu último contra o rival). Mas também se envolveria em uma polêmica com um de seus principais parceiros de time, o também atacante Ministro. A fofoca da época era que Caetano estava se galanteando para uma mulher do colega e que, por isso, poderia deixar o Palestra. O episódio levou “A Gazeta” a publicar uma curiosa nota, desmentindo um “boato” que ela própria noticiara: “Quanto às relações de amizade entre Caetano e Ministro, presentemente, são das mais cordeais. Ficam, portanto, desfeitos os diz-que-diz que por ai correm”.
No ano seguinte, o rendimento de Caetano não foi suficiente para levá-lo a novo Sul-Americano. Sem ele, o Brasil foi campeão em casa. Mas o jogador voltaria a encontrar façanhas em 1920: três gols no Parque Antarctica no primeiro jogo com o Palestra como proprietário, um gol na maior goleada da história do Palmeiras, titular na campanha do primeiro título paulista do clube.
Mas Caetano ficou fora da final. Por decisão da diretoria, ele e outros jogadores de destaque, caso de Grimaldi, foram substituídos. A decisão parecia uma loucura. Do outro lado, estava o time do supercraque Friedenreich, o Paulistano. Mas deu certo. Martinelli e Forte fizeram os gols da vitória de 2 a 1. Aproximava-se do fim a história de Caetano com a camisa palestrina. Ele ainda resistiria até o ano seguinte. Em julho, faria seu último jogo pelo clube – vitória de 4 a 1 sobre o Germânia. Pelo Palestra Itália, Caetano realizou 106 partidas.

                       Nos anos seguintes, Caetano defenderia São Bento e Independência. E então, em 1926, iria para a Portuguesa. E ao lado de Ministro. Em 2 de março daquele ano, “A Gazeta” noticiou:
“Caetano Izzo e João Ministro, os antigos futebolistas palestrinos, estão de novo na capital. Ambos iam voltar ao Palestra, formando a célebre ala Caetano – Ministro. No entanto parece que se firmaram na Portuguesa, pois defendendo este clube, jogaram domingo em Rio Claro, contra o Velo”.

                       Caetano e Ministro ficaram na Portuguesa para a disputa do Campeonato Paulista. E enfrentaram o Palestra. No Parque Antarctica, viveram experiência oposta àquela de anos antes: eram os adversários. Mas a dupla mantinha o talento do passado, e Caetano, no segundo tempo, deu assistência para Ministro marcar. Naquele momento, porém, o Palestra já vencia por 3 a 0.

LEMBRANÇAS

                        Caetano foi esquecido. Morreu pobre, enterrado em cova rasa, abandonado pela história, ignorado pelo público, órfão do reconhecimento que o futebol não lhe rendeu. Esta reportagem é uma tentativa de resgate da memória do primeiro herói do Dérbi: de suas façanhas e de suas desgraças. E foram muitas. Porque Caetano não foi pioneiro apenas no clássico. Com a camisa do Palmeiras, na época Palestra Itália, ele ajudou a construir a mitologia do clube. E ainda fez isso:
Fez o primeiro gol da história do Palmeiras no Parque Antarctica, em 1917, em vitória de 5 a 1 sobre o Internacional-SP, quando o campo ainda pertencia ao Germânia. Além dos três gols no primeiro clássico contra o Corinthians, esteve presente em todos os 11 primeiros duelos com o rival. Anotou sete gols no período.

                         Foi autor de um dos gols na maior goleada da história do Palmeiras: 11 a 0 sobre o Internacional-SP, em 1920. Fez três gols no primeiro jogo do Palmeiras como proprietário do Parque Antarctica: 7 a 0 sobre o Mackenzie, em 1920. Foi titular ao longo da campanha do primeiro título do clube, o Campeonato Paulista de 1920.

                          Por tudo isso, fica ainda mais dolorosa a notícia dada pelo Diário da Noite, na página 10 da edição de 30 de maio de 1973: “O sexto sepultamento que os coveiros fizeram, segunda-feira, no Cemitério da Saudade, em Marília, foi pobre, sem coroas, nem flores, nem acompanhamento. Velho, ignorado, sem recursos financeiros, enterrado em vala comum, ninguém se lembrou de Caetano Izzo”.

                          Em Marília, Caetano criou raízes e iniciou sua decadência. Nos anos 60, já tinha grandes dificuldades financeiras. Tanto que passou a receber auxílio público. Em 1969, o prefeito Octávio Barreto Prado (da Arena, partido que comandava a Ditadura Militar no Brasil) criou uma lei exclusivamente destinada a dar dinheiro ao ex-atleta. Ele passou a receber, mensalmente, 200 cruzeiros novos, que hoje, seria em torno de R$ 2,5 mil. O decreto lembrava que Caetano também defendeu a seleção brasileira.

                         Caetano fez 106 jogos pelo Palestra Itália, embrião do Palmeiras. Jogou de março de 1917 a julho de 1921. Sendo que onze partidas foram contra o Corinthians, onde marcou 7 gols. Venceu 6, empatou 2 e perdeu 3. Infelizmente Caetano nos deixou no dia 27 de maio de 1973, aos 76 anos de idade, deixando uma grande saudade aos amantes do futebol, em especial a coletividade esmeraldina.

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