AS BRIGAS NOS JOGOS DE VARZEA

                           O futebol de várzea sobrevive do amor. No caso, a palavra amor tem sinônimos como segunda casa, família, dedicação. Não é empreendedorismo, não é negócio. Tampouco é diversão, para aquele torcedor apaixonado pelo clube do seu bairro. Pra ele, que junto a outros diretores do clube, patrocinam o time com bola, fardamento, gelo, água, fruta, etc, a várzea é onde ainda vive o verdadeiro futebol. Ali não tem frescura, só joga quem quer jogar e quem quer jogar pra ganhar, e não só pra participar. O futebol é isso. Os grandes times não jogam futebol, aquilo lá é publicidade, coisa de político. Na várzea é futebol, amizade, amor pela bola.

                          Muito se fala em Mancha Verde, Gaviões, Independente, Força Jovem ou qualquer outra torcida organizada de algum time grande de futebol. E convenhamos, fica fácil torcer para equipes cheias de história, títulos, craques e patrocinadores, em cadeiras em arenas modernas e cobertas. As torcidas de times de várzea são diferentes. Não existe nada mais moralizador que apoiar a equipe amadora do seu bairro, e de quebra, fazer uma festa bonita como torcedor, cantando e, claro, intimidando o adversário que joga na sua cancha com uma atmosfera incrível.

                         Final de campeonato no futebol de várzea é mais ou menos assim: dois times fortes que se preparam para um verdadeiro duelo dentro de campo, mas fora das quatro linhas, são dois bairros que querem fazer mais bonito na festa. O resultado disso costuma ser um jogo pegado, de clima quente para todos os lados. No entanto, durante a partida, o clima esquenta cada vez mais. Quando um time está perdendo, a torcida adversário começa a zoar e não demora muito para o pau comer.

                         Foi assim que tudo começou num certo jogo que aconteceu na várzea de Santo André em 1967. Era um domingo pela manhã, o céu estava carrancudo, parecia até que já estava prevendo que algo de ruim estava para acontecer. O time da casa já estava no meio do campo batendo bola, quando chegou o caminhão trazendo o time adversário. O campo não tinha vestiário, o negócio foi se trocar lá atrás do gol. O juiz insiste para se apressarem, mas eles não estavam nem aí. Até que finalmente o time entra em campo e o juiz apita o início da partida.

                         Naquela época era comum ver os diversos times da cidade se defrontarem em algum campo do município, onde os prédios altos elevados nem estavam sendo planejados. Era um jogo comum, onde não estava valendo nada, nem mesmo uma simples taça. O time da casa estava indo, com sua gritando sem parar incentivando seus jogadores, mesmo porque, sabiam que o time adversário tinha jogadores muito bons.

                          O campo foi sendo rapidamente cercado pelos torcedores. Aproximadamente uns 600 deles estavam lá. Era um time muito popular. O campo não possuía arquibancada, naquela época a torcida ficava em volta de onde seria o jogo. O público era fervoroso, daqueles fanáticos pelo time. O time adversário só tinha 40, se acontecesse algo eram 15 contra um, era uma enorme desvantagem.

                          O jogo estava equilibrado, até que em um determinado momento, um torcedor do time de fora, acabou chutando uma bola para dentro do campo, justamente no momento que o centroavante do time da casa estava para fazer o gol. A torcida ficou revoltada com aquilo e partiu para cima daqueles jogadores e torcedores visitantes. Numa tentativa de sair daquela situação, dois torcedores do time de fora, sacaram armas calibres 38.

                          Os dois torcedores giraram, vagarosamente, com a arma em punho, mirando todos os que os cercavam. Assim que acabaram de dar uma volta completa, a torcida do time da casa e o time sumiram num piscar de olhos. Era gente escalando bananeira, pulando muro, se cortando em espinhos e se atrapalhando para correr. O pessoal da bateria que animava a torcida com um sambinha, largaram seus instrumentos no local e também saíram correndo para onde encontrassem um buraco, um vez que ao lado do campo passava um rio.

                          Até as donas de casa que moravam próximas ao campo ficaram assustadas com aquele corre corre, pois muitos deles pularam o muro de suas casas para se esconderem. Com tudo isso o jogo não chegou ao seu final por falta de atletas, uma vez que todos já haviam fugidos. Felizmente nenhum tiro foi disparado e assim puderam voltar a salvo para casa. Isto é, aqueles que moravam perto do campo, pois naquela confusão, o motorista do caminhão apavorado, foi embora com o veículo e largou os jogadores para trás, inclusive com suas roupas que haviam guardado lá.

                          Na semana seguinte o time que foi o visitante, mandou um ofício para o outro time convidando para fazerem um jogo amistoso no campo deles, oficio este que foi rasgado no ato.

Deixe uma resposta