PAULISTÃO de 1946

                Dia 10 de novembro de 1946, o São Paulo sagrava-se bicampeão paulista e de forma invicta, mas a luta foi bem mais árdua do que no ano anterior, já que o Corinthians ficou no páreo o tempo todo, tanto é, que a diferença de um para o outro na classificação final foi de apenas um ponto. Da equipe campeã de 1945, saíram o zagueiro Virgílio para a entrada de Renganeschi e entrou Luizinho no lugar de Barrios. Ambas as equipes foram dirigidas pelo competente técnico Joréca, o estrategista da época.

               Tudo começou no ano anterior, quando o São Paulo fez uma excelente temporada em 1945, conquistando o segundo título de sua história, mas em 1946 veio a confirmação do belo trabalho realizado anteriormente, sagrando-se campeão num campeonato que contou com 11 clubes, alguns já extintos, como o Jabaquara, o Ypiranga e o São Paulo Railway, mais conhecido por SPR. O campeonato começou dia 7 de abril com uma goleada da Portuguesa de Desportos sobre a Portuguesa Santista por 6 a 0. Neste dia também o Corinthians derrotou o Comercial da Capital Paulista por 4 a 3. O Tricolor fez sua estreia somente uma semana depois e também começou muito bem, goleando o Jabaquara por 4 a 0. Neste ano tivemos 11 equipes participando, que foram; (por ordem da classificação final) São Paulo, Corinthians, Portuguesa de Desportos, Santos, Palmeiras, Portuguesa Santista, Ypiranga, Comercial da Capital Paulista, São Paulo Railway, Juventus e Jabaquara.

               Desde o começo do campeonato já dava para notar que o título ficaria entre São Paulo e Corinthians. Na Sexta rodada eles se enfrentaram, depois de terem obtido cinco vitórias cada um. Deu São Paulo, 2×1, gols de Luizinho e Remo para o Tricolor e Milani para o Corinthians. Ao término do primeiro turno (10 rodadas), os dois estavam juntos novamente. O São Paulo havia empatado com a Portuguesa de Desportos em 1 a 1 e com o Palmeiras também por 1 a 1, enquanto que o Corinthians havia perdido somente para o São Paulo. O segundo turno foi quase repetição do primeiro.

               Quando se enfrentaram na sétima rodada, São Paulo e Corinthians estavam ambos com 2 pontos perdidos. Deu São Paulo novamente, e outra vez, 2 a 1, gols de Remo e Leônidas da Silva, enquanto que Baltazar marcou o único tento corintiano. Esse jogo aconteceu dia 29 de setembro no Pacaembu. Depois dessa derrota, o Corinthians praticamente disse adeus ao campeonato, pois faltavam somente três rodadas para terminar o campeonato. Na rodada seguinte o São Paulo empatou com a Portuguesa em 1 a 1 e o Corinthians venceu o Comercial da Capital por 2 a 0.  Na penúltima rodada, ambos venceram.

               A última rodada foi emocionante, pois a diferença era de apenas um ponto entre São Paulo e Corinthians. O jogo do Corinthians seria fácil, contra time pequeno, e o São Paulo jogaria com o  Palmeiras. Caso o Corinthians vencesse e o São Paulo empatasse, os dois terminariam com o mesmo número de pontos, sendo assim, teriam que fazer um jogo extra para decidir o título daquele ano. E caso o São Paulo perdesse e o Timão vencesse, o Alvinegro seria campeão. O Palmeiras, sem chances de título, queria ter o gostinho de empurrar o tricolor ao abismo, pois a rivalidade era muito grande. O Corinthians enfrentou o Juventus e goleou por 5 a 1, sendo assim, só a vitória interessava ao Tricolor.

O JOGO DO TÍTULO

               Este jogo aconteceu dia 10 de novembro de 1946, no Estádio do Pacaembu. O árbitro foi Bruno Nina, que expulsou Luizinho e Remo do São Paulo e Villadoniga e Og Moreira do Palmeiras. Para esta partida o técnico Joréca do São Paulo escalou a seguinte equipe; Gijo, Piolim e Renganeschi; Ruy, Bauer e Noronha; Luizinho, Sastre, Leônidas da Silva, Remo e Teixeirinha. O Palmeiras jogou com; Oberdan, Caieira e Gengo; Og Moreira, Tulio e Valdemar Fiume; Lula, Lima, Villadoniga, Canhotinho e Mantovani. O jogo foi muito disputado, inclusive com muita violência. Nesse jogo aconteceram alguns fatos que valem a pena ressaltar, como a grande briga envolvendo as duas equipes.

               O ponta Luizinho se desentendeu com o goleiro Oberdan do Palmeiras, o zagueiro Og Moreira tomou as dores do goleiro e acabou levando um cruzado de direita no queixo, que o levou a nocaute na hora, a partir daí o gramado do Pacaembu se transformou num campo de batalha e por isso o bravo zagueiro Renganeschi do São Paulo foi atingido no peito e se contundiu, como na época não era permitido substituições acabou ficando isolado na ponta direita só fazendo número.

               Já caminhávamos para o término do jogo quando aos 38 minutos da etapa complementar, Bauer foi cruzar e a bola, como que guiada pelos deuses do futebol, tomou o rumo do gol palmeirense. O goleiro Oberdan ainda conseguiu voltar e, num salto, prensou a bola na trave. Ela caiu mansa, quicando. Renganeschi, mesmo mancando muito e, esquecido pelos zagueiros alviverdes, arrancou inesperadamente e, com um esforço descomunal, como se fosse a bola de sua vida, tocou-a para o fundo das redes palmeirense e fez o gol histórico. Final de jogo, São Paulo 1×0 Palmeiras. E assim dessa maneira, o Tricolor sagrava-se campeão paulista de 1946 e de forma invicta. Disputou 20 jogos, venceu 17 e empatou 3. Por tudo isso, foi o legítimo campeão.

              Os três empates foram todos de 1 a 1. O primeiro foi contra a Portuguesa de Desportos no dia 23 de junho e o segundo foi contra o Palmeiras no dia 21 de julho, ambos no primeiro turno e novamente contra a Portuguesa de Desportos no dia 13 de outubro pelo segundo turno. E nas 17 vitórias obtidas, tivemos algumas que merecem destaque, como aquela contra o Jabaquara por 4 a 0, contra a Portuguesa Santista por 5 a 2, contra o Juventus por 7 a 3 e contra o Comercial da Capital por 6 a 2, todas pelo primeiro turno. Já no segundo turno o Tricolor venceu o Jabaquara por 4 a 0 e o Juventus por 7 a 1. Tudo isto sem falarmos das vitórias sobre Corinthians e Santos nos dois turnos do campeonato.  

              Esse título certamente fez o São Paulo crescer e ser mais respeitado, principalmente por seus maiores rivais, que sempre dividiam os títulos e o rotulava como time pequeno, mesmo porque o Tricolor foi fundado bem depois deles, a verdade é que não queriam que o São Paulo fosse grande, mas com o passar dos anos a coisa foi mudando e hoje é o clube brasileiro que mais títulos mundiais possui (3).

CURIOSIDADES

               Este gol histórico marcado pelo zagueiro argentino Armando Frederico Renganeschi, foi o único de sua carreira. Neste campeonato foram realizados 110 jogos e foram marcados 444 gols, que nos dá uma média de 4,04 gols por jogo. O artilheiro do São Paulo foi Teixeirinha com 14 gols, seguido de Leônidas da Silva com 12 e, o artilheiro da competição foi o jogador corintiano Servilio de Jesus Filho com 19 gols. Este Servilio é pai daquele Servilio que tanto sucesso fez na Portuguesa de Desportos e principalmente na Sociedade Esportiva Palmeiras na década de 60. O São Paulo marcou 60 gols e sofreu 20, dando um saldo positivo de 42 gols, realmente uma bela campanha.

               Outra curiosidade para os jovens de hoje, é que naquela época a classificação do campeonato, era por pontos perdidos, diferente de hoje que contamos os pontos ganhos. E mais, uma derrota valia 2 pontos e um empate 1 ponto. Sendo assim, os cinco primeiros colocados ficaram com estas pontuações; São Paulo 3 pontos (três empates), Corinthians 4 (duas derrotas para o São Paulo), a Portuguesa de Desportos com 12, o Santos com 18 e o Palmeiras com 20 pontos perdidos. O último colocado foi o Jabaquara com apenas 9 pontos, pois das 20 partidas que disputou, venceu somente quatro, empatou uma e perdeu quinze vezes. Marcou 27 gols e sofreu 52, dando um saldo negativo de 25 gols. Naquela época não havia rebaixamento, que começou somente dois anos depois.

               A derrota do São Paulo para o Corinthians no segundo turno do campeonato de 1945 (quarta rodada) por 2 a 1, até o quinto jogo do certame de 1947 (derrota para o Ypiranga por 3 a 2), O São Paulo ficou 30 jogos invicto, e tirou do Palmeiras um troféu que estava lá no Parque Antártica a mais de 10 anos, a “Taça dos Invictos”, que fez muito sucesso até meados dos anos 50. A Taça dos Invictos ficou com o Tricolor até 1956, quando o Santos de Pelé bateu o recorde do Tricolor.

               Neste time do São Paulo campeão de 1946, tínhamos dois argentinos. Um era Sastre, meia direita. Sastre era um jogador incomum pelo seu talento criador, pelo ritmo de seus movimentos com a bola ou sem ela e, principalmente, pela força de sua grande inteligência. O outro era Renganeschi, o primeiro Deus da Raça do nosso futebol. Se tornou ídolo no Tricolor principalmente por este jogo que deu o título paulista de 1946. No total ele fez 107 partidas com a camisa do São Paulo. E o mais incrível, apenas um gol, mas um gol que entrou para história.

               Depois que encerrou sua carreira de jogador passou a trabalhar como treinador e dirigiu grandes equipes do futebol brasileiro, como por exemplo, o próprio São Paulo, o Corinthians, o Palmeiras, o Flamengo onde foi campeão carioca em 1965 e tantos outros clubes. O São Paulo teve também outro grande jogador argentino que brilhou com a camisa tricolor, foi o goleiro Poy que na década de 50 foi um dos melhores goleiros do futebol brasileiro. Foi campeão paulista em 1957 e depois que encerrou a carreira de jogador também passou a trabalhar como treinador, onde também obteve muito sucesso. Teve também Albella e Negri ambos foram campeões paulista em 1953.

               Este foi o quarto título paulista do São Paulo F.C., incluindo aquele de 1931, quando ainda chamava-se São Paulo da Floresta. Lembrando que a mudança do nome aconteceu em 16 de dezembro de 1935. Até o começo dos anos 40, não era nada fácil dizer que torcia para o São Paulo, pois corintianos e palmeirenses não admitiam que houvesse outro time da grandeza deles. Mas, com o passar dos anos, a coisa foi mudando e hoje é um dos clubes que mais títulos conquistou em toda a história, tanto é, que dos clubes brasileiros, é o que mais títulos mundiais possui, ou seja, três. (1992, 1993 e 2005).

SÃO PAULO F.C.  CAMPEÃO PAULISTA DE 1946  –  Em pé: Paulo Machado de Carvalho, Rui, Bauer, Piolim, Gijo, Renganeschi, Noronha e o técnico Joréca    –    Agachados: Luizinho, Sastre, Leônidas da Silva, Remo e Teixeirinha

Deixe uma resposta