BRASIL x ARGENTINA: rivalidade de mais de um século

                    Brasil e Argentina foram sempre protagonistas de jogos emocionantes, decisões dramáticas e até batalhas campais. Por isso, sua velha rivalidade na bola e, as vezes na briga, se transformou no clássico do continente. Todo brasileiro que gosta de futebol odeia perder da Argentina. E vice-versa. A rivalidade se apóia em uma razão simples: ambos acreditam ter a melhor seleção do mundo. Juntas, as seleções já venceram 7 das 19 Copas do Mundo, além de 22 edições da Copa América. O equilíbrio entre as equipes é tão grande que, pelos dados da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), em 93 confrontos, o Brasil tem 37 vitórias contra 33 da Argentina e 23 empates. O Brasil marcou 148 gols e a Argentina marcou 147.

A PRIMEIRA PARTIDA OFICIAL             

                   Os primeiros encontros entre Brasil e Argentina foram disputados num clima de impecável cordialidade. Quando surgiu a Copa Roca, em 1913, levou-se a sério o objetivo do seu criador, o tenente-general Julio Roca, um apaixonado pelo futebol, que queria que a competição servisse para estímulo da juventude. No ano seguinte, os brasileiros apanharam um vapor para Buenos Aires, onde foram recebidos com flores. No dia 20 de setembro, foi disputado um amistoso em Buenos Aires, que terminou com a tranquila vitoria Argentina por 3 a 0.

                  Uma semana depois, dia 27 de setembro, aconteceu a primeira partida oficial entre Brasil e Argentina e foi válida pela Copa Roca. O jogador brasileiro Rubens Salles fez 1 a 0. No segundo tempo, o argentino Leonardi dominou a bola com a mão e marcou o que seria o gol de empate. O juiz brasileiro Alberto Borgerth, que também era médico cirurgião, validou o gol. No entanto, ninguém comemorou o gol. Foi aí que para surpresa de todos, o capitão argentino, Gallup Lanus, comunicou ao árbitro que o lance tinha sido irregular e seu time não aceitava a marcação do gol. Sendo assim, o árbitro voltou atrás, anulou o gol e o Brasil venceu sua primeira partida contra a Argentina. Ao final do jogo, milhares de torcedores invadiram o campo e carregaram nos ombros o goleiro brasileiro Marcos Mendonça. 

OS BRASILEIROS VIRARAM  MACAQUITOS              

                   Eram outros tempos, sem duvida. Isso ficaria claro em 1937, durante o Sul-Americano em Buenos Aires. Empatados, Brasil e Argentina partiram para a negra. Os brasileiros, nessa altura, ouviam xingamentos ao invés de aplausos. Nas ruas, eram muitas vezes chamados de macaquitos. Para provocá-los, alguns torcedores lhes perguntavam se existiam telefones no Rio de Janeiro. O jogo foi uma verdadeira guerra. Resultado: Tim saiu mancando. Cardeal foi carregado de maca, Bartô sentiu-se mal e Jau lesionou o ombro, ao término de um duelo dramático, sem gols. Na prorrogação, a Argentina chegou aos 2 a 0. Inconformada com um dos gols e assustada com a insegurança do estádio do San Lorenzo, a Seleção Brasileira tentou abandonar o campo. Mas a porta do vestiário estava fechada. Por muito tempo, a imprensa brasileira classificou a partida de “jogo da vergonha”.

OS JOGOS DAS VINGANÇAS E PERNAS QUEBRADAS

                 O Brasil queria vingança. E marcou data e local: 15 de janeiro de 1939, em São Januario, pela Copa Roca. Terceira colocada na Copa do Mundo, realizada na Franca no ano anterior, a Seleção Brasileira era realmente excepcional: Batatais, Domingos da Guia e Machado; Brito, Brandão e Médio; Luizinho, Romeu, Leônidas, Tim e Hercules. Pena que os argentinos apresentassem uma das maiores formações que o futebol Sul-Americano já viu: Gualco, Montanez e Coleta; Arcádio Lopez, Rodolfi e Suarez; Peucelle, Sastre, Massantonio, Moreno e Garcia.  

                 E o que aconteceu? O Brasil, que nunca fora derrotado por ninguém dentro do país, perdeu feio: 5 a 1. A Argentina chegou a colocar 5 a 0 no marcador. Ainda bem que haveria revanche. Seis dias depois, as equipes retornaram ao estádio do Vasco da Gama, completamente lotado. E que sofrimento: o Brasil sai na frente, os argentinos viraram para 2 a 1, o Brasil empata e, no finzinho, o juiz Carlos Monteiro (o mesmo dos 5 a 1), conhecido como Tijolo, marca um daqueles pênaltis duvidosos. Foi? Nao foi? Na duvida, Lopez agride o árbitro e apanha da polícia.

                 Em represália, os argentinos vão para o vestiário. A porta, dessa vez, estava aberta. Sem goleiro, Perácio que entrara no lugar de Tim, bateu afinal o pênalti. Os anais do futebol atestam que o Brasil ganhou por 3 a 2. Os argentinos desistiram de jogar a negra, e assim o Brasil foi proclamado vencedor da IV Copa Roca, de uma maneira inédita na historia do futebol Sul-Americano.

                 Dia 5 de março de 1940, a Argentina aplicou sua maior goleada sobre o Brasil, 6 a 1. O jogo foi em Buenos Aires. Vingança dessa goleada, só teríamos a 20 de dezembro de 1945, em São Januário, também pela Copa Roca, com uma categórica e retumbante goleada de 6 a 2, gols de Ademir de Menezes (2), Heleno de Freitas, Zizinho, Chico e Leônidas. Essa foi a maior goleada já registrada pelos brasileiros contra os argentinos. Mais do que os 6 a 2, no entanto, um acidente e que marcaria esse jogo. Autor de dois gols, Ademir Menezes, então um jovem de 20 anos, fraturou a perna de Batagliero, um zagueiro argentino de estilo viril. Mas foi puro acidente. 

                  Chegava então a vez dos argentinos pedirem vingança. Três meses depois, lá foram os assustados brasileiros para o Sul-Americano de Buenos Aires. Final contra quem? A Argentina, é claro. Como medida preventiva, Flavio Costa resolve deixar Ademir na reserva. Na véspera, numa tentativa de melhorar o ambiente, o chefe da delegação brasileira, Ciro Aranha, levou Ademir para visitar Batagliero. Deitado na cama, a perna engessada, Batagliero sorriu.

                 Antes da partida, José Salomon, zagueiro clássico, ídolo da torcida argentina, 44 jogos pela seleção, oferece uma cesta de flores ao veterano capitão brasileiro Domingos da Guia no centro do gramado. Mas o clima era de ameaças. Numa encenação montada antes, Batagliero desfilara de maca em redor do gramado. Dando a impressão que se dirigia aos jogadores brasileiros, a torcida bradava num tom patético. Era como se dissessem: “Vejam o que vocês fizeram com ele. Daqui a pouco tem troco!” 

                 Bola rolando, e aos 28 minutos, há uma bola espirrada na intermediaria entre Jair e Salomon. O capitão argentino entra de carrinho para ganhar a jogada de qualquer modo. Jair vira o rosto e levanta a perna, em atitude instintiva de defesa. O choque foi inevitável, com a perna direita de Salomon destrocando-se na sola da chuteira de Jair. Houve fratura dupla: tíbia e perônio. Salomon nunca mais se recuperou. Vendo que o argentino Fonda vem para acertá-lo, Jair chispa para o vestiário. Chico vem acudi-lo, segura Fonda e é derrubado por Strembel pelas costas.

                  De repente, está sozinho contra uma multidão de argentinos, soldados e jogadores. Levou pontapés, socos e, as mãos na cabeça, defendeu-se com bravura dos golpes de sabre. Por alguns minutos, ele viu a morte de perto. Sua sorte é que um árbitro careca, forte, grandão e corajoso, agente da Policia Especial do Rio de Janeiro, invadiu o campo e abriu caminho entre os cavalos, os soldados e os jogadores argentinos. Era Mario Vianna. Ele nunca soube ao certo como conseguiu carregar Chico e levá-lo a salvo até o vestiário.

                   O Brasil, trancado no vestiário, não pretendia voltar. Mas o chefe do policiamento do estádio advertiu que, nesse caso, não garantiria a segurança de ninguém. Lentamente os jogadores foram para o túnel. Recomeçado o jogo, mal Ademir tocou na bola, levou um soco na nuca que o deixou zonzo. Ademir não jogou futebol. Nem o resto do time brasileiro. A Argentina fez o que quis e só não marcou mais de dois gols (ambos através de Mendez) porque não se interessou. Os 2 a 0 lhe serviram para garantir o titulo de campeã da Sul-Americana.

                   E o Brasil se conformou, consciente de que tentar uma vitoria equivaleria a praticar um suicídio. Há quem jure que, pelo menos em um dos gols a zaga facilitou. Alguns jogadores, inclusive, chegaram a comentar isso, logo depois que o hidroavião da Panair deixou afinal para trás o Rio da Prata e suas duras lembranças.

OUTRAS PARTIDAS HISTÓRICAS

                    Só o tempo poderia apagar o pesadelo de 1946. Por dez longos anos, as duas seleções estiveram de relações virtualmente rompidas. A Argentina não veio ao Rio para o Sul-Americano de 1949 nem para a Copa de 1950. O Brasil também não foi mais lá até 1956, quando o tempo já se encarregara de apagar ao menos uma parte das imagens do pesadelo daquele verão portenho. Dia 7 de julho de 1957, pela Copa Roca, Brasil e Argentina fizeram uma partida que entrou para a história, pois foi neste jogo que Pelé fez sua estréia com a camisa da Seleção Brasileira e também marcou seu primeiro gol pelo Brasil, no entanto, a vitória foi da Argentina por 2 a 1.

                   Outros jogos importantes terminaram em goleadas. Em 12 de junho de 1960, no Maracanã, o Brasil goleou a Argentina por 5 a 1, pela Taça do Atlântico, gols de Pepe (2), Chinezinho, Pelé e Delem. Em 1964, a CBD promoveu a Taça das Nações, para celebrar o cinquentenário da sua fundação. A Argentina estragou a festa ao arrasar o Brasil por 3 a 0, em Sao Paulo, no dia 3 de junho, com o goleiro Carrizo defendendo um pênalti cobrado por Gerson. Em Copas do Mundo foram 4 os confrontos entre as duas seleções. No primeiro, na Alemanha em 74, o Brasil ganhou por 2 a 1. No segundo, na Argentina em 78, o empate sem gols. Em 1982, na Espanha, houve a vitória categórica do Brasil por 3 a 1.

                  E o quarto confronto foi em 1990, na Itália, quando perdemos nas oitavas-de-finais, aos 80 minutos de jogo, por aquele fatídico gol de Caniggia. Pela Copa das Confederações e Copa América, também tivemos grandes jogos entre brasileiros e argentinos. Na próxima quarta feira teremos mais um confronto entre estes dois países. Vamos torcer para que deixem de lado toda a rivalidade, pois só assim teremos um bom espetáculo de futebol, coisa que as duas seleções sabem como ninguém como proporcionar aos seus torcedores.

Seleção Brasileira de 1978 – Em pé: Toninho Baiano, Leão, Oscar, Edinho, Toninho Cerezo e Amaral    –    Agachados: Tarciso, Zico Reinaldo, Rivelino e Dirceu
Seleção da Argentina na Copa de 1978
Seleção Brasileira da Copa de 1986 – Em pé: Sócrates, Paulo Isidoro, Elzo, Júlio César, Edinho, Branco e Carlos – Agachados: Muller, Junior, Alemão e Careca
Seleção da Argentina da Copa de 1986

                                                   

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