SANTOS 11×0 BOTAFOGO – Dia 21 de Novembro de 1964

                 Na década de 60, tivemos um jogo de futebol que entrou para a história e que jamais será esquecido por aqueles que tiveram o privilégio de estar presente ao estádio de Vila Belmiro naquela tarde do dia 21 de novembro de 1964. Neste dia a tabela do Campeonato Paulista marcava o jogo entre Santos e Botafogo de Ribeirão Preto. Este campeonato foi marcado por muitos gols. Sua abertura aconteceu dia 5 de julho e já na primeira partida, tivemos uma goleada, onde o Corinthians derrotou a Prudentina por 6 a 0, com quatro gols de Flávio, um de Marcos e um de Silva. 

                No primeiro turno o Botafogo havia vencido o Santos por 2 a 0 e aquilo estava atravessado na garganta dos jogadores santistas, que prometiam uma vingança. Outro motivo para estarem com sede de uma boa apresentação, é que o Peixe vinha de uma goleada sofrida em Campinas pelo Guarani por 5 a 1. Sendo assim, o Botafogo e em especial seu goleiro Machado, iria pagar pelo que não fez. E assim dessa maneira chegou o dia da vingança. Na preliminar (aspirantes) o Santos venceu o Botafogo por 3 a 2. Para o jogo principal, o técnico do Santos, o popular Lula, mandou a campo os seguintes jogadores; Gilmar, Ismael, Modesto, Haroldo e Geraldino; Lima e Mengálvio; Toninho Guerreiro, Coutinho, Pelé e Pepe.

                Já o técnico Osvaldo Brandão do Botafogo de Ribeirão Preto escalou a seguinte equipe; Machado, Ditinho, Hélio Vieira e Tiri; Carlucci e Maciel; Zuino, Alex, Antoninho, Adalberto e Gazze. O árbitro da partida foi Carlos Drumond da Costa e o público foi de 9.437 pagantes, o que deu uma renda de Cr$ 14.210.800,00. Antes da partida houve um minuto de silêncio em memória ao ex-presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, morto há um ano atrás.

               Naquele dia o Santos conseguiu na Vila Belmiro uma das maiores goleadas conhecidas em certames oficiais na categoria de profissionais, derrotando o Botafogo de Ribeirão Preto por 11 a 0. Foi uma partida magnífica onde o Rei Pelé mais parecia uma “fera” solta dentro do “coliseu”, a devorar pobres e indefesas vítimas sob o delírio de um público que chegou a ficar de pé, sob uma chuvinha fria para aplaudir o maior jogador do mundo.

               As 9.437 pessoas que compareceram à tarde ao estádio da Vila Belmiro, assistiram uma partida histórica, que poderão contar com orgulho mais tarde para seus netinhos. O encarregado do placar foi a pessoa que mais trabalhou dentro do estádio e se viu as voltas com um problema inesperado, quando Pelé marcou o 10º gol para o Santos. Não havia número suficiente, e um torcedor logo gritou “tira a camisa do Pelé e coloca lá”. Um outro ao lado comentou: “É melhor parar por aí. Você já pensou se marcam mais dois gols, todo esse povo gritando queremos o 13º?  Irá criar uma problema social”.

                 Naquela tarde, Pelé superou todos os recordes mundiais na marcação de gols em uma única partida: fez 8, alguns como o 8º, 9º e o 10º, com um minuto de diferença um do outro, ou seja: aos 25, 27 e 28 minutos do segundo tempo. Somente a espera pela cobrança do pênalti deu refresco ao Botafogo. Quanto ao time de Ribeirão Preto, quase nada se pode dizer. Jogou como costumava jogar, era uma boa equipe, mas…  O maior elogio ao clube interiorano é o de que soube perder, sem apelar para violência, colaborando para o espetáculo, jogando um futebol bonito e vistoso. Seu erro foi querer atuar de igual para igual com o Santos, principalmente, porque não tinha um Pelé em sua equipe.

PRIMEIRO TEMPO

               Logo aos 3 minutos de jogo, Pelé balançava as redes do goleiro Machado, no primeiro gol da tarde, depois de receber um lançamento de Mengálvio pelo alto. Com um leve toque passou por Maciel, correu pela área e atirou rasteiro na saída do arqueiro: 1 a 0. A equipe do Santos dava, assim, sua primeira demonstração de que não estava para brincadeira e que entrara em campo para valer. De Gilmar a Pepe todos funcionavam como uma máquina, quase perfeita, sem erros.

               O Botafogo era envolvido normalmente. Assim, aos 8 minutos, novamente Pelé, deslocado pela meia direita em jogada idêntica a anterior, recebia um lançamento de Lima, passava na corrida por Tiri, dava um chapéu em Carlucci na entrada da grande área, caia para o miolo da mesma e atirava de pé esquerdo de forma inapelável contra a meta de Machado: 2 a 0. Pelé parecia já de forma endiabrada no campo e arrancava aplausos da torcida. Aos 16 minutos, novamente Pelé marcava. Num cruzamento de Toninho Guerreiro na direita para a marca penal, surgiu como um foguete e meteu a cabeça na bola, que tocou o solo e entrou no alto do gol de Machado: 3 a 0.

               O Santos pressionava de maneira impressionante e até esta altura o Botafogo havia tentado dois ataques, que terminaram com bola pela linha de fundo. Três minutos depois do terceiro gol, ou seja, aos 19 minutos, era a vez de Pepe assinalar o seu. Cobrando um escanteio da ponta esquerda, acertou um tremendo tiro a gol, que o goleiro Machado tentou rebater de soco, mas a bola tocou em sua mão e ganhou efeito para o fundo do gol: 4 a 0.  Pelé parecia satisfeito e mudou de posição com Coutinho, que passou a jogar pela direita, enquanto “ele” caia para a esquerda e mais recuado.

               Aos 25 minutos Coutinho recebeu a bola na intermediária pelo lado direito. Correu com ela e Pelé desceu ao seu lado. Coutinho deu-lhe em diagonal, Pelé deixou a bola passar, virou de costas e deu de calcanhar para Coutinho que continuava correndo rumo ao gol, sob medida. Coutinho apenas amorteceu a bola e empurrou para o fundo das redes na saída do arqueiro: 5 a 0. Foi um gol maravilhoso, que o torcedor santista aplaudiu de pé. Os botafoguenses já não sabiam mais o que fazer. O técnico Osvaldo Brandão fez uma alteração na defesa. Recuou Hélio Vieira e Zuino, que podem ser considerados os dois melhores zagueiros do Botafogo, mas a tática não deu resultado e Pelé continuava o mesmo, fazendo suas diabruras a não parar mais.

              Aos 35 minutos, Pelé penetrou pela área levando todo mundo e foi derrubado por Carlucci. Penal legítimo que o árbitro não assinalou. Aos 38 minutos, Pepe cobrou novo escanteio, desta vez pela direita. Pelé amorteceu a bola no peito, no bico da pequena área, e encheu o pé de esquerda. A bola tocou em Carlucci e voltou para ele, que emendou novamente, agora de pé direito, do jeito que ela veio. A bola ricocheteou na perna de um defensor do Botafogo e foi para o fundo do gol: 6 a 0.   Dois minutos depois, novamente Pelé, voltava a movimentar o marcador, no mais belo gol da tarde. Pepe correu pela ponta esquerda e cruzou para dentro do gol, a meia altura. Coutinho se atirou de cabeça e furou. Pelé que vinha atrás, lançou corpo no ar e apanhou a bola de pé direito, acertando um verdadeiro voleio, mandando a bola para o alto do gol, sem possibilidade de defesa. Terminava o primeiro tempo, com o Santos vencendo por 7 a 0, sendo que 5 dos gols foram de Pelé. No intervalo do jogo o roupeiro do Santos apanhou a bola e guardou-a de recordação. Foi necessário providenciar uma nova bola para a segunda etapa.

SEGUNDO TEMPO

               Na fase final o Santos voltou mais acomodado no gramado e não se preocupando muito em fazer gols. O Botafogo começou a pressionar um pouco e Antoninho aos 10 minutos perdia a maior oportunidade da partida, possibilitando ao goleiro Gilmar uma grande defesa. A torcida santista já se desesperava e pedia mais um.  E Pelé resolveu atender ao pedido da torcida.  Aos 25 minutos, quando recebeu um lançamento de Mengálvio pelo alto. Pelé estava impedido, mas o bandeirinha não assinalou. O “crioulo” correu, passou por Hélio Vieira e enganou com o corpo ao arqueiro. Da linha de fundo chutou para o fundo das redes: 8 a 0.

               Um minuto depois, Pepe penetrou pela esquerda e foi aterrado por Ditinho. Penal que Pelé cobrou e marcou: 9 a 0. Um minuto depois, novamente Pelé aparava um cruzamento de Pepe da esquerda e marcava seu oitavo gol na partida e o Santos fazia 10 a 0.  Coutinho perdeu ainda um gol certo aos 38 minutos e finalmente aos 45 minutos, Toninho Guerreiro marcava o seu, depois de receber um lançamento de Coutinho na meia lua. Amorteceu a bola no peito, deixou-a cair e chutou rasteiro, sem chance para o goleiro Machado: 11 a 0.

               Terminava assim um jogo que ficará na memória dos que estiveram no estádio e que terá que ser registrado na história do futebol mundial, como feito heroico de um atleta, consagrando o trabalho de toda uma equipe. A imprensa santista considerou o goleiro Machado como o melhor jogador em campo, caso contrário seria no mínimo 25 a 0. Esta foi a terceira maior goleada do Santos em Estaduais. Antes, venceu duas vezes por 12 a 1: contra Ypiranga, em 1927, e Ponte Preta, em 1959. No ano seguinte, em 1965, o Santos voltou a golear o Botafogo, desta vez foi 7 a 1, com três gols de Pelé.

MAIS GOLS DE PELÉ

               Quinze dias depois de vencer o Botafogo por 11 a 0, o Santos enfrentou o Corinthians no Pacaembu. O Corinthians que já vinha de duas derrotas, uma de 4 a 2 para a Portuguesa de Desportos e outra de 4 a 1 para o Palmeiras, iria enfrentar o Santos que tinha um ataque infernal comandado por Pelé. E não deu outra, em mais uma tarde inspirada do Rei, o Santos venceu a partida por 7 a 4, com Pelé marcando 4 gols. O técnico do Corinthians era o saudoso Osvaldo Brandão que havia saído do Botafogo dias atrás, ou seja, em apenas 15 dias ele levou 18 gols do Peixe em apenas duas partidas, sendo 12 do Pelé. Neste Campeonato Paulista de 1964, o campeão foi o Santos o vice foi o Palmeiras e o artilheiro foi Pelé com 34 gols. Em toda sua carreira Pelé marcou 1.281 gols, sendo 95 pela Seleção Brasileira. Quem teve o prazer de ver Pelé jogar, pode-se considerar um sujeito privilegiado e agradecer a Deus.

SANTOS F.C DE 1964 – Em pé: Lima, Zito, Geraldino, Joel, Mauro e Laércio      –      Agachados: Peixinho, Mengalvio, Toninho Guerreiro, Pelé e Pepe
BOTAFOGO FUTEBOL CLUBE   (Ribeirão Preto-SP) – 1964      –     Em pé: Tiri, Tatau, Tarcisio, Julião, Ditinho e Machado      –     Agachados: Zuino, Alex, China, Nair e Juan

 

2 comentários em “SANTOS 11×0 BOTAFOGO – Dia 21 de Novembro de 1964

  1. Bom demais.
    Saudades desse timaço chamado SANTOS F.C
    Tempo que jogadores de futebol jogavam por paixão e não por dinheiro.
    Parabéns Zé pela matéria.
    Abraços.

Deixe uma resposta